E sobre Domenico e a Nostalgia

sábado, 10 de julho de 2010



"Se morrer, morro


Interessa que te dei os meus olhos, meu amor, tragicómica, eu, de ser para ti para sempre
Se viver, vivo
deixei de ver
E que me lembre do poder do verbo, da súmula das palavras, da imensidade dos sentidos, da licenciosidade dos significados
Se tremelicar, tremelico
e não segura
Que te tenha dito tantas vezes que, além dos meus olhos, te dei o vidrino fio da minha conivência perpetrada até à linfa das coisas invisíveis
Se definhar, definho
e desvario
Mãe, que a ti te tenha feito sentir o apreço ao aleatório vagaroso e narcótico
Se tombar, tombo
e me estendo, enfim
Que as alas se abram para o meu cancro de alma se purgar e se livrar de mim, no finalmente
Se vagarar, vagaro,
ela toma-me a expressão, rouba-me da língua a palavra
Que apareçam os gatos perdidos e se soltem os enclausurados, para que me despeça
Se vaguear, vagueio
naquele sítio entre o céu e a terra e sonho
Que os doidos saiam à rua de chapéu para cantar e dançar, que eu sou uma deles
Se ceder, cedo
e cedo cedo
Que a perfídia se assuma vestida de Fátima e Maria.

Que a loucura seja ensinada nas escolas, como uma extravagante ciência humana, no mesmo módulo da poética.


Meus filhos, que vos possa ter feito entender a mensagem excelsa da liberdade.
Porque hoje morro.
Hoje morro de desesperança e fracasso, de incapacidade.
Morro, porque não fiz por vós o suficiente, nem por mim, nem por homem algum, morro de uma doença que não se alivia, que não melhora, de uma contusão de corpo inteiro, morro de crescimento e madureza, porque sou tão nova para ser imputada, tão nova para ver gastas as minhas ficções de Paris e de amor romântico.

Morro porque não quero morrer."